Boxe (DocLisboa #9)
Ver certos filmes é um pouco como levar porrada num ringue de boxe. Entramos dispostos a isso, mas com a esperança que tal não aconteça. Logo de início sujeitamo-nos aos golpes mais duros, alguns deles abaixo da cintura ou mesmo ilegais. Nada que se compare à selvajaria do kickboxing, no entanto. O nosso corpo debate-se cansado, esgotado, com as ideias confusas, tentando defender-se. Porque não desistir e cair no tapete? Seria, sem dúvida, mais saudável. E o cansaço prolongar-se-á muito tempo depois do combate terminado. Mas há algo de tortuoso que nos prende ali, que nos faz persistir no encontro contra aquele outro corpo maligno, desenhado para nos torturar ao máximo, para nos subjugar. São muito apreciados, certos filmes massacrantes. | Mas, assim ao de perto, enquanto notamos o prazer que tomam em nos magoar, em nos subjugar, em fazer dano, percebem-se melhor, bem melhor do que se tivéssemos abandonado antes, as suas limitações, a sua verdadeira pequenez, a sua miséria. Nem todos os dias nos sentimos capazes de contemplar a massacrante pequenez alheia, mascarada de grandeza estética. Queríamos era ser como Muhammad Ali no mítico combate contra George Foreman no Zaire em 1974. Aguentar os golpes dançando, iludindo o cansaço, e, bem no fim, experimentar a reviravolta impensável com uma simplicidade nunca vista. Mas que reviravolta pode experimentar um espectador de cinema sujeito aos filmes-George Foreman vestidos de artista? O que criar de toda a subjugação? |
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