Ainda não começámos a pensar
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 Cinema e pensamento | On cinema and thought                                                                              @ André Dias

Ao pé da letra #20 (António Guerreiro)

«O capitalismo é a celebração de um culto

Há um fragmento de Walter Benjamin que só recentemente começou a ser lido. Chama-se O Capitalismo como Religião. Os argumentos que Benjamin aí esboça não são simétricos dos que levam geralmente a considerar o comunismo, e por vezes o marxismo, como uma religião. É que o capitalismo, lemos aí, não se define em relação a um dogma ou a uma ideia – é “uma religião puramente cultual, a mais extremamente cultual que alguma vez existiu”.
Um traço que define esse culto é a sua duração, o facto de ser permanente, celebrado todos os dias e a todas as horas, “todos os dias são dias de festa”. E, na definição de Benjamin, o culto não é expiatório, é culpabilizante. À luz deste texto, as palavras que mais se têm ouvido projectam-se com inaudita intensidade neste estado religioso do mundo, precipitado num movimento monstruoso. Uma dessas palavras, “confiança” (a palavra-chave), é a transposição da “fé” para um plano secularizado. E os teólogos dizem-nos que sem esta profana fé a “mão invisível” (do mercado, isto é, do Criador) nos atira para o Inferno. Como haveríamos de duvidar, se até as setas dos gráficos bolsistas, quando apontam para baixo, se parecem com caudas do diabo?»
António Guerreiro, «Ao pé da letra», Expresso-Actual, 18.10.2008.

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