As imagens são literais
« – Escreveu em frente ao ecrã, no escuro?
G. D. – Não escrevo durante a projecção, parece-me bizarra essa ideia. Mas depois, tomo notas assim que possível. Sou um espectador naif. Acima de tudo, não acredito na existência de graus: não há um primeiro grau, um segundo, um terceiro grau. Aquilo que é bom no segundo grau, é-o também no primeiro, aquilo que é nulo no primeiro mantém-se assim no segundo ou no milésimo. Todas as imagens são literais, e devem ser tomadas literalmente. Quando uma imagem é plana, é sobretudo preciso não lhe atribuir, mesmo em espírito, uma profundidade que a desfiguraria: é isto que é difícil, captar as imagens enquanto dado imediato. E quando um cineasta indica «atenção que é apenas cinema», trata-se ainda de uma dimensão da imagem que é preciso tomar à letra. Há muitas vidas distintas, como dizia Vertov, uma vida para o filme, uma vida no filme, uma vida do próprio filme, que devem ser captadas conjuntamente. De qualquer forma, uma imagem não representa uma realidade suposta, é para si própria toda a sua realidade. »
(Gilles Deleuze, «Portrait du philosophe en spectateur» (1983), entrevista por Hervé Guibert, [trad. minha], Deux régimes de fous, Minuit, Paris, 2003, pp. 199-200)
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