Ainda não começámos a pensar
                                               We have yet to start thinking
 Cinema e pensamento | On cinema and thought                                                                              @ André Dias

Ode a Bruno S. | Ode to Bruno S.


«A natureza do seu relacionamento de trabalho com Klaus Kinski está já muito bem documentada, mas como descreveria a sua experiência com Bruno S., a estrela de Kaspar Hauser e Stroszek?
HERZOG – Isso requereria uma resposta muito longa, vou tentar centrar-me. Bruno é um homem cuja vida foi catastrófica na juventude e isso obviamente tornou-o uma pessoa “difícil” de lidar, porque ele suspeitava de qualquer pessoa do exterior, não confiava em ninguém. Tive de estabelecer uma confiança com ele e, depois de ter estabelecido essa confiança, ele tornou-se alguém muito fácil de trabalhar com. Por vezes parava de trabalhar vociferando contra as injustiças do mundo. Eu mantinha a equipa toda nos seus lugares. Dizia-lhes que mesmo que levasse três ou quatro horas com Bruno sempre a falar das injustiças, estaríamos lá e todos ouviríamos. Era sempre significativo. Fazia sempre contacto físico com ele. Agarrava-o sempre e segurava-lhe o pulso. Isso fazia-lhe sempre bem. De resto, é um homem de capacidades fenomenais e de uma profundidade e sofrimentos fenomenais. Transparece na imagem como nada que eu alguma vez fiz transparece. É, para mim, o Soldado Desconhecido do cinema.
Ainda está em contacto com ele?
HERZOG – Dado que agora vivo nos Estados Unidos, há já bastante tempo que não o vejo. Já está reformado. Costumava trabalhar numa fábrica de aço como condutor de uma empilhadeira.»
«The nature of your working relationship with Klaus Kinski has been very well documented, but how would you describe your experience with Kaspar Hauser and Stroszek star Bruno S?
HERZOG – That would require a very long answer but I'll try to focus. Bruno is a man whose life in his youth was catastrophic and obviously made him a "difficult" person to deal with because he would be suspicious of anyone from outside, he would not trust anyone. I had to establish trust and having established trust with him he was very easy to work with. Sometimes he would stop work by ranting against the injustices of the world. I would stop the entire team in their tracks. I told them that even if it takes three or four hours of non-stop Bruno speaking about injustice we would be there and we would all listen. That was always significant. I would always make physical contact with him. I would always grab him and just hold his wrist. That always did him good. Otherwise, he is a man of phenomenal abilities and phenomenal depth and suffering. It translates on the screen like nothing I have ever done translates onto a screen. He is, for me, the Unknown Soldier of Cinema.
Are you still in touch with him?
HERZOG – Since I live in the United States now I have not seen him for quite a long time. He is retired now. He used to work in a steel factory as a forklift truck driver.»

Werner Herzog, in BBC Four Q&A, 27.3.2003


Arquivo / Archive