Ainda não começámos a pensar
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 Cinema e pensamento | On cinema and thought                                                                              @ André Dias

Ao pé da letra #128 (António Guerreiro)

A ideia de geração, que nunca teve uma definição precisa e sempre consentiu ser determinada por critérios diferentes, tornou-se recentemente, na cultura dos filisteus, uma palavra-maná. Uma meta-história que se dedique ao estudo dos ritmos históricos partirá desta verificação: a tendência da nossa época para escandir o tempo em períodos cada vez mais breves e para encurtar os ciclos dos balanços, das retrospetivas e das efemérides faz com que se esteja constantemente a cavalgar o tempo para proceder à atualização das novas formas e tendências da época, criando a ilusão de que algo de novo se está sempre a passar. Assim, a ideia de geração tronou-se mais plástica e flutuante do que nunca e passou a servir uma débil sismografia sociológica que tem nos media a sua estação meteorológica. Esta vaga ideia de geração foi suscitada sobretudo por outra vaga ideia, que é a de juventude. 

A atual categoria de juventude é uma invenção recente. Simultaneamente etária e cultural, surgiu nos anos 50 do século passado, nos tempos áureos do acesso ao consumo, da cultura pop e da contracultura. Expressão suprema desses tempos eufóricos, a juventude foi quase entendida como um novo sujeito da História. Desse lugar de vanguarda, passou nos últimos tempos — segundo o discurso da nossa sensibilidade epocal — para o lugar dos que nem chegam a ter lugar na dialética histórica. Provavelmente, esta narrativa será reescrita de outra maneira. Entretanto, convém saber que no início do século passado, meio século antes da invenção da nossa categoria de juventude, surgiram os movimentos de estudantes e juvenis. Mas, então, a juventude, mais do que uma categoria etária e sociológica, reivindicava-se como uma “categoria do espírito”, dotada de uma força crítica que queria assumir uma missão que, na altura, se dizia com estas palavras: “tarefa histórica”. 

António Guerreiro, «Ao pé da letra», Expresso-Atual, Portugal, 26.2.2011.

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