Ao pé da letra #29 (António Guerreiro) «“Renovar a esquerda” é a linguagem de uma mitologia Roland Barthes, que tem andado por estes anos injustamente esquecido, era um homem de esquerda. E, nessa condição, a sua preocupação maior foi sempre a de desmontar as “mitologias” (fossem elas de esquerda ou de direita), isto é, a cultura de massas, as construções ideológicas, os discursos que se apresentam como evidências e devem o seu poder de circulação ao estatuto “natural” que adquirem e os subtrai à crítica. Os mitos da direita procuram a sua raiz no espaço originário e a-histórico das ideias sem palavras; os mitos da esquerda são antes a manifestação tagarela das palavras sem ideias. | Roland Barthes não formulou a questão desta maneira, mas no seu horror fóbico pelo estereótipo sentiu sempre a necessidade de se desviar criticamente de todas as linguagens, sempre que começavam a “pegar”. Quando hoje ouvimos falar em “renovar a esquerda” e vemos alguma gente mobilizada em torno dessa tarefa, é preciso analisar essa expressão como uma linguagem parasitária, uma enorme e velha mitologia que impede precisamente que se pense algo de novo. Nada pode ser renovado com esta linguagem porque ela não é senão a perpetuação de ritos e mitos mecanizados.» António Guerreiro, «Ao pé da letra», Expresso-Actual, 19.12.2008. |
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