Ainda não começámos a pensar
                                               We have yet to start thinking
 Cinema e pensamento | On cinema and thought                                                                              @ André Dias

Ao pé da letra #81 (António Guerreiro) 
«Sobre a sensibilidade da época e o sentido do trágico 
Em 1910, há um século, a Europa preparou-se com temor supersticioso para a visita, a 17 de Maio, do cometa Halley. O acontecimento foi celebrado literariamente e festejado pelas multidões como se estivessem a assistir ao renascimento dos deuses pagãos. Mas esse foi também o ano de outros prodígios não escritos nas cartas astronómicas: surge a música atonal de Schoenberg, Alban Berg e Webern; sai o livro de Carlo Michelstaedter A Persuasão e a Retórica, a mais famosa tesi di laurea da universidade italiana e o documento extremo da consciência trágica da época (o autor suicidou-se no dia a seguir, com 23 anos); Rilke publicou os seus Cadernos de Malte Laurids Brigge; é construído o edifício Steiner, de Adolf Loos, em Viena, para grande escândalo do imperador, que se recusava a olhar para ele; o jovem Lukács publicou A Alma e as Formas.

A sensibilidade epocal encontrava em todas estas realizações artísticas uma configuração nítida e um destino. Era o tempo da tragédia da cultura. Nós, que vamos este ano comemorar o centenário da República, convinha percebermos o que, simultaneamente, e noutras latitudes, estava em jogo com um sentido do trágico para nós desconhecido.»

António Guerreiro, «Ao pé da letra», Expresso-Actual, 6.2.2010.

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