Ainda não começámos a pensar
                                               We have yet to start thinking
 Cinema e pensamento | On cinema and thought                                                                              @ André Dias

Factos e fraudes

– Lucrecia Martel é uma realizadora contemporânea interessante [certo, isto não é um facto, apenas uma opinião pessoal];
– O Festival "Fervor de Buenos Aires" do CCB inclui um “Ciclo de cinema Lucrecia Martel”, sublinhado Buenos Aires e cinema;
– Segundo o programa do CCB, Lucrecia Martel fará a apresentação de LA MUJER SIN CABEZA, sua última longa-metragem, a 12 de Março, sem sublinhados;
– O Ípsilon, suplemento cultural do jornal Público, pela pena do seu editor Vasco Câmara, deu destaque à vinda da realizadora no principal artigo da página de entrada com o título «Lucrecia Martel, mulher de grande cabeça, vem a Lisboa», sublinhado editor Vasco Câmara;
– Segundo o mesmo suplemento, “logo a seguir ao ciclo, LA MUJER SIN CABEZA estreia em sala”, sublinhado estreia em sala e não se indica a distribuidora;
– O ciclo Lucrecia Martel compõe-se de três sessões, com uma curta e três longas-metragens, sem sublinhado;
– O Ciclo tem como “comissário” João Lopes, sublinhado João Lopes e comissário;
– Segundo o programa do CCB, a projecção do ciclo de cinema é feita em ecrã 4x3 metros”, sublinhado é a primeira vez que vejo indicado o tamanho do ecrã num programa de cinema deste género;
– Idem, “a projecção do ciclo de cinema é feita em [...] formato DVD”, sublinhado compreendo agora e ainda bem que avisam;
– Ibidem, o preço para cada uma destas sessões de projecção de DVD é 2 euros, sublinhado preço e DVD;
– E, last but not least, nenhuma longa-metragem de Lucrecia Martel se passa em Buenos Aires *:
Pergunta: Podem confirmar-me se algum dos filmes de Lucrecia Martel tem a cidade de Buenos Aires como cenário? [...] Aqui em lisboa vai haver um festival dedicado à cidade de Buenos Aires que inclui uma retrospectiva de Lucrecia Martel. Achei bizarro.
Resposta: «No, los tres largometrajes de Martel transcurren enteramente en la ciudad de Salta, a 1500 km de Buenos Aires. Saludos, assinado Quintín», [sublinhado cidade de Salta e a 1500 km de Buenos Aires]; 
– Lucrecia Martel nasceu no dia 14 de dezembro de 1966, na província de Salta, Argentina [fonte: Wikipedia];
– O Ípsilon deu este destaque todo** a um ciclo de projecção de DVDs, integrado num festival sobre Buenos Aires cujas reproduções de filmes não têm nada a ver com Buenos Aires. Porquê? Porque Lucrecia Martel vem a Lisboa arrebentar as vossas cabeças. Bem-vinda! 

* Quando se diz [digo eu, provavelmente imitando alguém] que programar é antes de mais inventar desculpas para passar bons filmes, convém que as desculpas sejam também elas boas.
** O que isto me lembra, passe as diferenças, é aquele plano de MANUFACTURING CONSENT em que Noam Chomsky compara o comprimento desmesurado dos artigos do New York Times dedicados ao problema do Cambodja por relação aos dedicados a Timor Leste.

Adenda: Para que este tipo de fraude institucional, comissarial e editorial comece a acabar, ou continue vitoriosamente mas com algumas dificuldades, este blogue estará em breve em condições de oferecer, em mão, DVDs piratas de LA MUJER SIN CABEZA de Lucrecia Martel a todos os leitores lisboetas que o pedirem através de mensagem de email; ensinará também os menos informados, a pedido, a procurarem os filmes que desejam na internet; ponto final.

Termo de responsabilidade: O autor é parte interessada nestas questões porque, para além de espectador atento e exigente, exerce actividade muito irregular de programador de cinema; o ciclo de cinema A crueldade depois do teatro – Os filmes de Angela Schanelec, sublinhado película e com a presença da realizadora, começa precisamente na noite da apresentação do DVD de Lucrecia Martel; os mais cínicos encontrarão aqui a resposta rápida que precisam para as suas aflições maniqueístas. 

1 comentário:

Anónimo disse...

Poco diplomático, tienes toda la razón del mundo. Algo parecido ocurre un poco en cualquier parte.
Miguel Marías


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