Ao pé da letra #55 (António Guerreiro) «Entre os ícones e os ídolos, instaurou-se a confusão | |
De onde vem o equívoco que leva a uma utilização inadequada da noção de ícone, quando se diz, por exemplo: “Michael Jackson era um ícone da nossa época”? “Ícone do meu tempo” foi como Malevitch definiu o seu Quadrado Negro, em 1915. E, três anos depois, com o seu Quadrado Branco sobre Fundo Branco, alcançava a pureza absoluta de uma pintura que se liberta do visível, contrariando o que Schleiermacher tinha sentenciado um século antes: “Nenhum pintor faz uma pintura sobre um fundo branco.” A noção de ícone, tem na sua origem, uma dimensão religiosa, que está bem patente no debate bizantino sobre a legitimidade dos ícones, da representação do divino. | Um ícone cumpre plenamente a sua missão negando-se como imagem, ou melhor, instaurando-se como imagem totalmente transitiva, através do qual se acede ao reino do invisível, do qual o ícone é uma epifania. Deve ter havido um momento, muito próximo de nós, em que o ícone foi tentado a abandonar a via da pureza, da ascese, da desencarnação da imagem e a experimentar a tentação da carne exuberante – um momento em que os deuses se retiram e os ícones passaram a ser ídolos.» António Guerreiro, «Ao pé da letra», Expresso-Actual, 11.7.2009. |
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