Le filmeur
Le filmeur de Alain Cavalier (2005) 100'
« Os primeiros planos do filme foram filmados em 1994, no momento em que passei a ter um diário íntimo com uma câmara em vez de com uma caneta. As últimas imagens datam de 2005. Mais de dez anos de vida em cem minutos de projecção.
Em grande parte das cassetes gravadas havia muito desperdício, entre o não mostrável e o incompreensível. A verdadeira dificuldade na escolha e organização dos planos era o reconhecimento dos não-ditos e da sua importância. Quando se filma ao vivo [sur le vif], não se fazem comentários, não se tenta ser compreensível, vive-se. »
Em grande parte das cassetes gravadas havia muito desperdício, entre o não mostrável e o incompreensível. A verdadeira dificuldade na escolha e organização dos planos era o reconhecimento dos não-ditos e da sua importância. Quando se filma ao vivo [sur le vif], não se fazem comentários, não se tenta ser compreensível, vive-se. »
« Pode dizer-se de Le filmeur que é um diário íntimo?
Sim, porque tomo como material a minha vida pessoal. Mas a palavra “íntimo” permanece em debate ou por definir. Para organizar muito ou pouco a desordem absoluta que em mim reina, preciso de sair de mim para olhar e escutar o mundo. O exterior e o interior não estão nunca separados um do outro. Todo o filme dito autobiográfico é na verdade um olhar para o exterior. Le filmeur é um filme introspectivo, mas através do olhar sobre os outros. »
Sim, porque tomo como material a minha vida pessoal. Mas a palavra “íntimo” permanece em debate ou por definir. Para organizar muito ou pouco a desordem absoluta que em mim reina, preciso de sair de mim para olhar e escutar o mundo. O exterior e o interior não estão nunca separados um do outro. Todo o filme dito autobiográfico é na verdade um olhar para o exterior. Le filmeur é um filme introspectivo, mas através do olhar sobre os outros. »
« Não se interroga muito sobre o espectador...
... sim... penso nisso...
... o espectador de cinema chegou a uma idade em que espera isso, talvez?
Penso que o espectador, no seu inconsciente ou na sua vida, já acumulou toda uma série de experiências cinematográficas. Há sequências das quais viu muitas combinações. Não diria que fez progressos, mas que sabe coisas. Logo, é preciso tentar apresentar-lhe as mesmas coisas, ou seja, as expectativas, os desejos, as decepções, enfim, aquilo que compõe a trama das nossas vidas. Mas é preciso fazer sempre um esforço para não repetir o que os outros fizeram porque, desse modo, as pessoas não redescobrem a vida, a sua própria vida, e não ficam gratas. Descobrir, como diz Pascal, uma riqueza que existe nelas, que elas ignoram e, a partir do momento em que se a revela, elas ficam gratas ao filme. E dá-las de graça, é um dom, um presente... Desde logo, filmar apenas coisas que nós próprios tenhamos reconhecido, percursos que se conhecem bem.
Coisas que se viveu.
Sim, ou que outros viveram ou filmaram. É entre duas vivências que a coisa fervilha. » (Alain Cavalier)
« Por outro lado, é flagrante que o vídeo digital lhe tenha permitido aprofundar a relação entre quem toma a decisão de filmar e o mundo que filma; de obter, no próprio facto de carregar a câmara e de entrar, desse modo, em contacto físico com o que o rodeia, algo da ordem de um tremor íntimo imediatamente registado, de uma emoção táctil, de uma troca audaz e misteriosa entre si e o que o rodeia. (...)
Todo o encantamento e chatices do quotidiano, a inconcebível leveza do destino humano que se mantém, do nascimento à morte, em equilíbrio precário por cima do abismo. Um sopro, um murmúrio, parecidos aos da sua voz que procura, como em confidência, o possível equilíbrio com esse mundo que a sua mão enquadra às apalpadelas.
Na linha de mira: o espectador como indivíduo e igual, a quem faz crer que o filme não está afinal à altura da ligação que suscita. Suprema elegância, mas piedosa mentira, sendo a arte maior evidentemente necessária ao reconhecimento que lhe devemos.»
... sim... penso nisso...
... o espectador de cinema chegou a uma idade em que espera isso, talvez?
Penso que o espectador, no seu inconsciente ou na sua vida, já acumulou toda uma série de experiências cinematográficas. Há sequências das quais viu muitas combinações. Não diria que fez progressos, mas que sabe coisas. Logo, é preciso tentar apresentar-lhe as mesmas coisas, ou seja, as expectativas, os desejos, as decepções, enfim, aquilo que compõe a trama das nossas vidas. Mas é preciso fazer sempre um esforço para não repetir o que os outros fizeram porque, desse modo, as pessoas não redescobrem a vida, a sua própria vida, e não ficam gratas. Descobrir, como diz Pascal, uma riqueza que existe nelas, que elas ignoram e, a partir do momento em que se a revela, elas ficam gratas ao filme. E dá-las de graça, é um dom, um presente... Desde logo, filmar apenas coisas que nós próprios tenhamos reconhecido, percursos que se conhecem bem.
Coisas que se viveu.
Sim, ou que outros viveram ou filmaram. É entre duas vivências que a coisa fervilha. » (Alain Cavalier)
« Por outro lado, é flagrante que o vídeo digital lhe tenha permitido aprofundar a relação entre quem toma a decisão de filmar e o mundo que filma; de obter, no próprio facto de carregar a câmara e de entrar, desse modo, em contacto físico com o que o rodeia, algo da ordem de um tremor íntimo imediatamente registado, de uma emoção táctil, de uma troca audaz e misteriosa entre si e o que o rodeia. (...)
Todo o encantamento e chatices do quotidiano, a inconcebível leveza do destino humano que se mantém, do nascimento à morte, em equilíbrio precário por cima do abismo. Um sopro, um murmúrio, parecidos aos da sua voz que procura, como em confidência, o possível equilíbrio com esse mundo que a sua mão enquadra às apalpadelas.
Na linha de mira: o espectador como indivíduo e igual, a quem faz crer que o filme não está afinal à altura da ligação que suscita. Suprema elegância, mas piedosa mentira, sendo a arte maior evidentemente necessária ao reconhecimento que lhe devemos.»
(Jacques Mandelbaum, «Lettre à un cinéaste qui libère son spectateur», Le Monde)
«Sendo que a matéria do seu cinema é o que há de mais rico, a vida, o quotidiano, quer isso dizer que nunca se cansará de fazer cinema?
Sim, porque posso igualmente conceber o limite extremo que consiste em tentar fazer um filme sobre os meus derradeiros momentos. Porque não? De tempos a tempos, dou por mim a pensar nisso. Isto levanta problemas também porque não se pode estar muito diminuído, é necessário ter ainda algumas forças. E fazer algo que nos ajude a desaparecer, trabalhando sobre isso. E depois, tentar dar, aos outros, uma versão que não seja aterradora.
Tem alguns projectos?» (Alain Cavalier)
Sim, porque posso igualmente conceber o limite extremo que consiste em tentar fazer um filme sobre os meus derradeiros momentos. Porque não? De tempos a tempos, dou por mim a pensar nisso. Isto levanta problemas também porque não se pode estar muito diminuído, é necessário ter ainda algumas forças. E fazer algo que nos ajude a desaparecer, trabalhando sobre isso. E depois, tentar dar, aos outros, uma versão que não seja aterradora.
Tem alguns projectos?» (Alain Cavalier)
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