Ao pé da letra #62 (António Guerreiro) «O que é o ideal goethiano de uma literatura mundial? | |
Quem consultar as páginas literárias dos mais importantes jornais europeus, será levado a pensar que elas foram atravessadas, nas últimas semanas, por um cometa que traçou com a sua trajectória um espaço literário internacional. Esse cometa chama-se “2666” e é o romace póstumo do escritor chileno Roberto Bolaño. Conhecemos o fenómeno com os Harry Potter e os Dan Brown. Mas aí podemos dizer que se trata de mundialização comercial, não de internacionalismo literário. Ora, neste caso, todos proclamam que se trata de uma obra-prima, algo que não estamos habituados a que circule facilmente no mundo inteiro, em traduções quase simultâneas. | Podemos encontrar aqui a prova de que a literatura nacional não significa grande coisa. Mas a literatura mundial, no sentido de Goethe, é a coexistência activa das literaturas contemporâneas, não é a criação de um espaço literário homogéneo atravessado por cometas e iluminado por umas poucas estrelas da universal e vazia constelação literária. “2666” pode ser um romance genial, mas seria ingénuo pensar que a sua difusão configura uma planetária república das letras governada pelo ideal goethiano de uma literatura mundial.» António Guerreiro, «Ao pé da letra», Expresso-Actual, 20.9.2009. |
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